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A Casa do Patrimônio Serra da Capivara representa a incubadora de projetos interdisciplinares ligados a educação e preservação do patrimônio cultural, material e imaterial na Região Sudeste do Piauí, e esta ligada ao IPHAN em parceira com as universidades locais e as comunidades que vivem e produzem cultura no entorno do Parque Nacional Serra da Capivara.

terça-feira, 13 de outubro de 2015


Os Amores Turvos de Virginia Woolf.
 
 
 
Gênesis Naum de Farias


 
A tristeza que a consumiu, levou sérios dias para se intensificar quando a notícia do seu falecimento veio a tona e, o mundo reconheceu sua genialidade fora dos muros daquela charneca sombria. Havia naquele dia um sol que denunciava o que deveras ter acontecido ao se fazer sabido que uma linda mulher havia entregue sua existência ao desamor do suicídio... Deixava para trás o abandono, a solidão e o desencanto amordaçado da esperança, entregando-se ao reino do silêncio dos fortes para manifestar suas queixas amorosas, na entrega fatal do suplício. Sua conversa com os mortos, imprimia impiedosa tristeza ao ressuscitar inquietações antigas, na memória que lhe dizia que as horas estavam findas.
Ao se fragmentar, não olhou para o que ficava, deixou o tempo do mesmo jeito que o havia visto, seguiu firme esquecendo os embaraços ao descobrir sua alma vazia de contentamentos e assombrada com a sina que legara para os seus, deixando nos pensamentos, as dores ao olhar para si com o esmero de quem queria esquecer as desditas dos desencontros e seguir firme o destino que se impunha para mergulhar profundamente no si de tudo...
A literatura era mais que um exercício intelectual, se refinava a cada escrito que parecia dizer tudo, e não dizia nada. Era uma máquina existencial de descobertas e ressurreições. Evidenciava sempre a célebre recordação de que mortos e vivos estavam condenados a amar no doloroso ressurgir de lendas passadas ao vento pelas recordações suplicantes dos olhares que a perseguia na efêmera atribulação dos dias. A dificuldade era esquecer o papel da memória, quando confirmava a assustadora inquietação de que era sabedora dona de sua própria alma ao revelar seus segredos e traduzir-se mediunicamente e escrever como se falasse a um colóquio particular para mortos e vivos. Seus segredos eram a um só tempo seus desvelos mais sinceros, estando sempre solitária no seu canto, remando contra a maré dos acasos, reconstruindo o passado na assombrosa prospecção do futuro.
Escreveu para antecipar acontecimentos e visualizar o que poderia ser sensível aos olhos dos homens na generosa ideia da redenção, pretendendo salvar-se do desamor que guardava na alma, fingindo recordar-se de um sonho febril muito antigo para dizer-se única numa verdade nunca antes realçada pelo poder da reparação sincera, quando as palavras tomavam outros rumos depois que a paixão desinteressou-lhe e reduziu-lhe ao afeto dos bichos e das plantas, ao dar sentido a todas as flores que plantara nos jardins do seu próprio estro...
O encontro fatal e sem nuances com o real a devastou, esmigalhando suas pétalas no pior verão de todos aqueles anos, ao passar muitas manhãs se torturando com dores nunca antes sentidas; dores lancinantes, torturantes, indefiníveis. Era um sentimento de absoluto desespero. Cuidou de si, da casa, das flores, do jardim e da existência como nunca se tinha visto naqueles infindos anos. Passou a definhar sozinha na imersão bruta da realidade como se o véu protetor da ilusão tivesse, definitivamente rasgado e um dia ela tivesse que ser exposta ao frio das horas mortas, chegando a nominar sua estranheza mais habitual no interessante desvelo dos seus alumbramentos de mulher sofrivelmente triste.
O seu desnudamento definitivo veio com a insistência das palavras recobrando que sua alma já tardava em se recolher ao esquecimento mais tardio, escondendo-se no transe estranho da verdade. Seus retratos eram impecáveis de desolação, nada parecia passar com os anos, e suas verdades não lhe pouparam nada, nem o impecável semblante de pensar que queimando sua escrita, deixaria o tempo merecer outros enfáticos elogios. Engajada e amante pública daqueles que não tem sentimentos foi-se deixando levar pelas águas frias do lago como uma Ofélia ao de debutar em despedidas nunca antes intransponíveis, e agora não tinha mais as palavras que outrora lhe insultava os breus. Agora se despedia da existência deixando calar a palavra que outro dia ressuscitou recordações grandiosas para se lançar ao mundo dos mortos e matar o que lhe era mais notável, a solidão!
Sua sina era retumbada naqueles instantes, porque estava viva demais para suportar o peso das ações que a duplicava em proporções absurdas, não tolerando mais o peso dos mundos e o desenrolar das horas. Entregou-se ao silêncio lento de quem leva uma rosa ao amor mais tardio, deixando-se levar pela correnteza fria das amarguras na leve pluma de um grande encontro... O grande silêncio se despedia das palavras para golpear decisivamente a soberba, partindo para habitar outros mundos e esquecer a festa dos acontecimentos, afastando-se das palavras vivas, despedindo-se da alma, quando abraçada ao esquecimento, expôs-se impiedosa, frente ao devastador semblante da morte, quando outrora ressuscitou os mortos, resolveu se entregar ao argumento sinistro e enlaçar-se ao que mais lhe torturava num mundo maquínico, podendo escrever em outras plagas, onde o silêncio lhe cobrasse mais doçura e menos crenças... Foi-se massacrada pelos ir e vir das horas...
De qualquer maneira, a imagem daquela mulher se entrelaça e testemunha-se mutuamente, porque inevitavelmente nos conduz a uma imagem ligada à soberania das mulheres de gênio e raça, forte como leões e generosas como idealistas de outros tempos, transcendendo o olhar das épocas. Seu estilo traz algo de magnífico quando ainda assim, podemos pensar para além das aparências no decorrer desses tempos líquidos. Em busca do seu tempo perdido, podemos denominá-la incrivelmente refinada e bela como uma imposição, tendo a origem e os brios britânicos enraizados na excentricidade de uma elegância intransponível, impecável e transgressora. Parecia conter uma essência de caráter de oposição e de revolta, mas bastante necessária para combater e destruir a trivialidade monótona dos dias. Era dona de uma altivez desejosa e desesperadora, no entanto, dotada de uma representação que sedimentava o que de melhor se poderia encontrar no orgulho humano. Vem daí a altivez daqueles que insiste em nos dizer que uma mulher provocadora pertence a uma casta transcendente, muito interligada com os valores do decadentismo, farta da insensibilidade frívola e hedonista dos dias atuais.
Notoriamente adepta de um refinamento despojado e intrínseco, implacável na excentricidade, era uma mulher de preocupações externas, especialmente quando lidava com o espírito do tempo. Sua figura remonta desassossegos, envolvendo-a numa esfera de elegância minimalista, transportando de vez o sentido da afetação ao despudor do olhar masculino da época. Seu jeito de escrever nos apresenta novamente algo de único que ainda assim, nos faz decorrer sobre as ilusões da vida em oposição ao que se estabelece impermanente. Sua retórica, na história da indumentária literária se estabeleceu adornada com laços ocultos neste passeio ao farol dos exageros humanos, quando sempre deixava de lado as conveniências do dia a dia para vestir-se discreta, incrivelmente bela, tomando a forma que pretendia por sua atitude e estilo de vida.
Tornou-se com o tempo, uma personagem de si mesma, que era ela mesma uma propagadora entranhada na existência do outro. Algumas vezes, nos seus livros, temos a nítida sensação de que narrava seu encontro fictício consigo mesma, ao tratar da vida moderna como se desenhasse o que não poderia deleitar-se, como parâmetro para a definição da essência atemporal da mulher sofrivelmente solitária. Transgressora e critica mordaz dos relevos sólidos das relações humanas, condenou os preconceitos repudiando os valores modernos de civilização, ousando falar da sua própria condição de mulher aviltada, no seu modo de encarar sua liberdade. Desse modo, não se tornou apenas uma oposição a estética fria daquela época, mas fez de si uma opositora a tudo aquilo nos subterrâneos da alma quando desafiava as normas da estética machista impondo-se impecável e sedutora na identidade e na revelação da sexualidade muitas vezes alcunhada e preconcebida frente ao figurino pouco generoso das convenções de gênero; flertava despudoradamente com o mundo de forma verdadeira, revelando seus sentidos mais indesejados e indiferentes. Queria possuí-lo, queria encarná-lo...
Era incomparável em seus gestos e atitudes ao trajar-se sofisticadamente elegante e impecável, seus deboches biográficos ao se disfarçar na lenda que criou para si nas concepções do mundo. Acredito que não a aceitaram do jeito que se propunha a ser, mas reservou sua candura adorável para esculpir no espírito do seu tempo, a mulher de costumes calculada para conseguir o que almejava, cujos retratos são crônicas da vida como ela é.  Sua excentricidade refletiu a construção da imagem das suas personagens, que retrata um universo paralelo em meio ao estilo deslocado da vida moderna ao se utilizar da linguagem do absurdo para documentar o senso comum e familiar da sociedade, trazendo de forma interessante, sentidos para as inquietações mundanas. Ao se entregar ao ir e vir das horas, tornou-se uma lenda recorrente, frente à insensatez humana...

 

 

sexta-feira, 9 de outubro de 2015





A Pesquisadora com Mestrado em Preservação do Patrimônio Cultura/Iphan, Joseane Pereira Paes Landim,
Participará da 1ª Jornada PEP/MESTRADO Patrimônio Cultural e Participação Social,
Que ocorrerá  no dia 19 de outubro de 2015, no Palácio Gustavo Capanema, Rio de Janeiro.  Na ocasião Joseane Pereira apresentará um Resumo da sua Dissertação que trata da Memória dos Maniçobeiros da Serra Branca.
 



quarta-feira, 16 de setembro de 2015

 

Exposição Patrimônio Imaterial - Lugar, Cotidiano e Existência
















Exposição Patrimônio Imaterial - Lugar, cotidiano e existência

Apresentação da Exposição


Esta exposição se empenhou em registrar algumas das manifestações do patrimônio imaterial são-raimundense que estão em processo de continuidade e modificação, natural aos movimentos de atualização que os fluxos modernizadores apresentam.
A exposição ocorreu entre os dias 19 de agosto a 4 de setembro de 2015, no Centro Diocesano de São Raimundo Nonato. Foi organizada pela Casa do Patrimônio Serra da Capivara, com a participação das seguintes instituições: IPHAN, UESPI, IFPI, UNIVASF, FUMDHAM e Fundação Sudeste do Piauí.

Categorias do Patrimônio Cultural Imaterial: Saberes e fazeres, Celebrações, Lugares e Formas de Expressão

Saberes e Fazeres
 
Atividades desenvolvidas por pessoas que são conhecedoras de técnicas e de matérias-primas que estão associadas a grupo social ou uma localidade.
Os fazeres são consequências dos saberes, é a realização efetiva da tradição, é quando pegamos o passado e o trazemos para o presente, e unimos origem e criação.

Celebrações
 
Os ritos e festividades associados à religião, à civilidade, aos ciclos do calendário são ocasiões que reúnem as pessoas para praticar papeis sociais com regras muitos específicas, acompanhados de comidas e bebidas, vestuário especial e ornamentação de determinados lugares, acompanhados de músicas, orações e danças.
São atividades que produzem os sentidos específicos de lugar e de território.

Lugares
 
São chamados de lugares as atividades humanas realizadas em local específico e com sentido cultural para as pessoas da comunidade.
São espaços apropriados por práticas e atividades de natureza variada, tanto cotidiana quanto excepcionais, tanto vernáculas quanto oficiais.

Formas de Expressão
 
Formas não-linguísticas de comunicação associadas a determinado grupo social ou região, desenvolvidas por pessoas ou grupos reconhecidos pela comunidade e em relação às quais o costume define normas, expectativas, padrões de qualidade.


FONTE: IPHAN. Inventário Nacional de Referências Culturais. Brasilia: Departamento de Identificação e Documentação do IPHAN, 2000.

Fotos do Seminário Patrimônio Imaterial - Lugar, cotidiano e existência









Seminário Patrimônio Imaterial - Lugar, Cotidiano e Existência


Seminário Patrimônio Imaterial - Lugar, Cotidiano e Existência



Por iniciativa da Casa do Patrimônio Serra da Capivara e com a participação de pesquisadores da UESPI, UNIVASF, IFPI, IPHAN e com apoio da Fundação Sudeste do Piauí e do Centro Diocesano de São Raimundo Nonato, idealizou-se este seminário, que ocorreu entre os dias 17 e 19 de agosto de 2015 no auditório do Centro Diocesano de São Raimundo Nonato.

A Constituição Federal de 1988 é o marco legislativo que inaugura o reconhecimento dos bens de natureza imaterial como componente do Patrimônio Cultural Brasileiro por serem portadores de referência à identidade e à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira.

Para concretizar as inspirações de nossa carta magna, o Decreto nº 3.551 de 04 de agosto de 2000 instituiu o Registro de Bens Culturais de Natureza Imaterial no Brasil. O Estado assume, assim, as tarefas do identificar, reconhecer, documentar e registrar saberes, celebrações, lugares e formas de expressão vivenciadas pelos reais detentores desses modos de existir que precisam de meios para continuar. Segue par-a-par com o respeito à legitimidade das diferenças e a extraordinária riqueza da diversidade cultural brasileira que é expressa pelo pensar, o criar, o fazer e o viver.

A Semana do Patrimônio instituída pelo IPHAN e comemorada entre os dias 16 e 22 de agosto, celebra os 15 anos desse importante instrumento legal.

Hoje, segundo dados do IPHAN, são 37 Bens Registrados em 15 anos de uma trajetória onde o poder da criação (original) faz-se criação de poder (institucional), sob constante movimento, em permanente interação, onde o respeito ao que nos antecedeu revitaliza o nosso hoje.

Este panorama, quando trazido para o contexto do semiárido piauiense, vê no ano de 2012 o município de São Raimundo Nonato completar seus 100 anos de existência. Cidade em franca expansão de sua área urbana, rapidamente tem seu patrimônio construído sendo modificado em nome da modernização, fato que também altera as relações humanas e os processos culturais.

O Seminário Patrimônio Imaterial – Lugar, Cotidiano e Existência tratou de tudo e buscou registrar algumas das manifestações do universo simbólico-cultural são-raimundense que estão em processo de continuidade e modificação, natural aos movimentos de atualização que os fluxos modernizadores apresentam.

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Lançamento do Novo Livro do Poeta Gênesis Naum de Farias


A Casa das Sete Luas


Gênesis Naum de Farias


Nas Ruas do Velho Centro Comercial, por estes dias passeia a doce Salete, travestida no seu fino xaile, doado por um cliente caridoso, que amante da noite, tecia seu véu de ternura em galanteios eloqüentes e muito decote. Porém, na rua, os últimos ruídos da noite, cada vez mais distantes, armavam sua teia de ternura pelo tempo com a profusão dos espíritos de uma rebeldia romântica e muito desnuda, ao febril e evasivo tormento dos seus palácios. Era aquela travesti do antigo cabaré Tombadim do Mariano, bêbada e velha a lembrar saudosa, seus belos dias nas épocas dos tempos, vaidosa que era no romantismo das lembranças e das saudosas noites do sertão ribeirinho. Era ela, bela e agradável a vista, tal qual um belo anjo estampado no frontispício de um velho altar de igreja sorumbática.

Naquele bordel, mais conhecido como o Recreio da Lua Branca ou A Casa das Sete Luas, um dia cantou noitadas, viveu feliz e amou a vida como o último instante de sua jovialidade, mas entrou para a história, com os seus sofrimentos, porque amou um nobre, falido; uma espécie de dândi contumaz, bem generoso, que viajava sempre daqui pra li, sem cultivar da crítica citadina, certa estima, por isso sofreu os dissabores nos dias de frio e solidão.

Seu jeito calmo contagiava a boemia da cidade dos impossíveis e imperava sua majestade por onde passava. Era a sonhadora de um viver triste, mas sempre feliz em sua pequena timidez, preferia o beijo esperado por muito tempo, porque lhe saciava a alma e fazia-se valorizar no grande momento da ausente volúpia; de róseas face, de dourada tez e olhos de ressaca, negros e embaçados que, com sua pureza, diziam tudo e não dizia nada, mesmo sabendo que por onde passasse, sua linguagem e seu cheiro, sofria a censura dos olhares provincianos do povo desta terra, mas redimida e embelezada, oferecia-se em contemplações de abandono e má fé pelos que de longe sussurravam seu velho e bom passado.

Sua sensualidade poética idealizou-se nas mesas da luxúria, num parto imaginário, sem rumo nem reverso, transcrevendo a forma mais alegórica do cotidiano de uma velha prostituta, do largo mais famoso e badalado da Passagem de Joazeiro, com suas amigas voluptuosas e seus deslumbrados fregueses, sejam eles poetas ou homens ricos e donos do poder político. Na sua morada de perdição e sossego, o pecado parecia não existir, pois seu cheiro, sua classe e o seu glamour povoavam o sonho febril dos donatários destas terras e seus comércios. Ela era uma messalina, e o impressionante é como os homens apreciam essa gente.

O lugar era povoado de muita sutileza, sabendo que além de mulheres voluptuosas, seu largo recebia diariamente homens cultos, políticos e toda uma gama de santos envolvidos pelo ar do mistério e anonimato ali presente como ingredientes para boa conversa, traições, prevaricações e festas noturnas. Entretanto, apesar do glamour, aquelas mulheres representavam a verdadeira mazela produzida pelo progresso da sociedade, com seus preconceitos entranhados no recalque social. No entanto, aquele reduto boêmio abrigava metáforas vivas, pois retratava o pacto social, envelhecido nas insanas hostilidades da época.

A Casa das Sete Luas retratava todo o abandono sofrido pelas funcionárias voluptuosas e suas personagens clássicas advindas dos palácios de antigas cidades portuárias. Salete, órfão de pai e filha da cidadezinha mineira Santana dos Ferros, se perdeu de amor por um boêmio, desses da chamada geração perdida, que intrigava a todos com o seu excesso de pudor ao quebrar barreiras se apaixonar por aquelas musas a desnudar. A mesma chegou a receber presentes de homens ricos e até propostas de casamento, mas dizia que seu lugar era no Tombadim, porque figurava o insaciável desejo pelo prazer e a boa vida oferecida pelos moradores bem dignos desta província.

A própria Salete dizia que era uma figura carregada de significados simbólicos, devido à sua beleza, mas sabia que era amaldiçoada pelas famílias puritanas, porém amada noite adentro pelos grandes donatários destas cercanias, madrugadores em busca de prazeres nas camaradagens das noites do Tombadim. Hoje Salete definitivamente assombra, assusta e se deslumbra com a sua memória, pois troca encantos relembrando sua jovial e temperada época de cabaré em cabaré, a dançar despudoradamente no seu deleite desvelado e antipuritano; a sonhar, no seu portar magistral de pobrezas simples, em fragmentados lençóis, com os amores turvos de sua mocidade, com o ouvido atento aos boleros e as marchas de carnaval em lânguidos e dolências de desencontros, escondidos na humildade e revelado na timidez de cenas quase cinematográficas, através do mundo áspero e cruel do destino.

Sua vida marginal e apaixonada marca o tempo no rebento de sua máscara, pois disfarçada de mulher no espaço das luas brancas e dos amores distantes, passeia pelas ruas do nosso tempo como uma mulher bêbada e sofrida, mas saúda o seu tempo na casa dos afetos, como o ponto fixo de sua existência, que um dia sonhou violar com sua infância estelar no lugar mais mágico de sua mocidade, impressos na sua alma como o ponto cardial que nunca mais poderá voltar.

  
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FARIAS, Gênesis Naum de. Lavoura de Insônias. – São Paulo: Scortecci, 2015. p. 170-172.